domingo, 22 de novembro de 2009

CHEGAMOS!

Não é fácil velejar de Noronha para Natal! Essa afirmativa é minha e sei que não consigo nem meia dúzia de velejadores para confirmar o que digo, mas é assim que eu vejo.
Este ano largamos muito bem e com uma tripulação muito afinada. Navegamos durante o primeiro dia próximo dos concorrentes, mas durante a noite a coisa mudou por completo. Sei que nossas velas não estavam em bom estado, mas mesmo assim o barco vinha velejando bem, fazendo média de 6 nós de velocidade, com previsão de chegada em Natal por volta das 17 horas do dia seguinte.
Acho que cansamos! Só pode ser isso! Vínhamos de uma maratona de 84 horas de velejada entre Recife e Noronha, com mais três dias de passeios e comemorações na ilha. Problemas com o motor e ainda por cima sem nosso piloto automático, que é maior bem do velejador de oceano. Demos uma relaxada e o mar assumiu o comando da situação.
O vento e o mar até que estavam bons durante o Sábado, mas na manhã do Domingo o horizonte começou a apresentar uma nova cena e nenhum barco no visual. Apenas ouvíamos pelo rádio as comunicações entre os participantes e o Rebocador de Alto Mar Triunfo, da Marinha do Brasil, que acompanhava a regata.
A bordo o clima era de cansaço, mas a tripulação continuava firme nas brincadeiras e bate-papos intermináveis. Dessa vez a cozinha não funcionou a contento, Lucia não estava bem, mas mesmo assim ainda saiu uma brava feijoada em lata e uns lanchinhos básicos.
Logo após o meio dia o céu se pintou de guerreiro com nuvens escuras, ventos mais fortes e chuvas isoladas. O mar gostou da brincadeira e entrou na dança com muita vontade. Se Natal estava perto, numa hora dessas parece que a distância duplicou de tamanho e lá se foram todas as previsões por água a abaixo. É incrível como a relação de distância e mar mexido não combina!
Mas, a vida a bordo dos seis tripulantes do Avoante, não estava tão ruim assim. Tudo bem que as ondas estouravam no costado e não deixava ninguém enxuto. Tudo bem que o cansaço cobrava sua parte. Tudo bem que o conforto não era mais o mesmo. Mas, a proximidade de casa, fazia a turma sonhar com uma caminha macia, um chuveiro quente e uma mesa farta. Onde estamos? A 40 milhas de Natal!
Uma chamada geral da Natal Rádio, fez despertar a autoridade do nosso proeiro, que abanou a função nas velas e foi assumir o posto de Oficial da Marinha do Brasil. Entrou em cena o Capitão dos Portos do Rio Grande do Norte, Francisco Vasconcelos.
Pela chamada geral, uma embarcação estava à deriva a 40 milhas da costa da Paraíba e precisando de socorro imediato, com risco de afundar. Cinco milhas a nossa frente o veleiro Vetinho também estava em dificuldades, com um cabo de aço que segura o mastro quebrado e sendo apoiado pelo Rebocador Triunfo.
O Comandante Vasconcelos, de pronto, assumiu o rádio e entrou em contato com o Rebocador. Após alguns minutos de comunicação, o Rebocador saiu em direção à costa paraibana e o Avoante passou a ser o barco de apoio da regata, dando suporte ao Vetinho. Ficamos um pouco apreensivo, o mar naquele momento não estava para peixe. Ainda mais que conhecíamos a tripulação do veleiro Acauã, o barco a deriva na costa paraibana.
À tardinha o vento aumentou chegando a 25 nós, trazendo chuva forte e muitas ondas. O mar se arrepiou ficando todo encarneirado e ondas mais afoitas começaram a estourar quase dentro do convés. Ansiosa, a tripulação olhava atenta em busca das luzes da cidade do Natal.
O Farol de Mãe Luiza piscou ao longe, mais nuvens negras surgiram no horizonte. Rizamos a vela genoa e alteramos o rumo para a boca da barra. Nunca desejei tanto chegar a Natal!
Fernando, Marta, Simarone, Hélio e Vasconcelos, vocês não sabem a alegria que tivemos em ter vocês a bordo do nosso Avoante. Acho que nunca tivemos uma tripulação tão amiga e tão afinada. Queiram desculpar nossas deficiências e o desconforto durante estas 500 milhas oceânicas a bordo de nosso barquinho. Mas fiquem certos que tudo que fizemos foi de coração e com o mais puro sentimento de amizade, humildade, lealdade, zelo e amor para com o próximo.
Muito obrigado e voltem sempre ao nosso Avoante!

Nelson Mattos Filho
Velejador

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